domingo, 31 de julho de 2016

Oprah

Are you listening to your life? Short story de Parker J. Palmer, publicada no livro abaixo.

"Accepting this birthright gift of self turns out to be even more demanding than attempting to become someone else. I've sometimes responded to that demand by ignoring the gift or hiding it or fleeing from it, and I don't think I'm alone. An old Hasidic tale reveals both the universal tendency to want to be someone else and the importance of becoming one's self: Rabbi Zusya, when he was an old man, said: "In the coming world, they will not ask me, 'Why were you not Moses? 'They will ask me, 'Why were you not Zusya?'.


domingo, 24 de julho de 2016

Mais Riobaldo




Ah, mas falo falso. O senhor sente? Desmente? Eu desminto. Contar é muito, muito dificultoso. Não pelos anos que se já passaram. Mas pela astúcia que têm certas coisas passadas - de fazer balancê, de se remexerem dos lugares. O que eu falei foi exato? Foi. Mas teria sido? Agora, acho que não. São tantas horas de pessoas, tantas coisas em tantos tempos, tudo miúdo recruzado.

terça-feira, 19 de julho de 2016

Uma ciência

Já falei isso dezenas, centenas de vezes. Mas falo de novo: se tem algum cronista como Veríssimo, eu não conheço. 



Decidiram fazer um churrasco para as famílias se conhecerem. Do lado da Bea havia seu pai, sua mãe, um irmão mais moço e uma tia solteira. Do lado do noivo, Carlos Alberto, a mãe viúva, duas irmãs mais velhas, sendo uma com uma namorada, e um irmão com a mulher e dois filhos menores. O churrasco seria na casa da Bea, que tinha um pátio grande com churrasqueira. O Carlos Alberto se prontificou: seria o assador.

Acertaram a logística do encontro. Os donos da casa forneceriam as saladas e a cerveja, os visitantes trariam a carne, a sobremesa e os refrigerantes, inclusive zeros para quem estivesse controlando a glicose. E o assador. Tudo transcorreu bem. Uma das crianças ralou o joelho e, segundo o consenso geral, exagerou um pouco nos gritos para chamar atenção, a tia solteira da Bea bebeu demais e caiu da cadeira, mas fora isso, tudo bem. Todos se entenderam, se divertiram - a namorada da irmã mais velha do Carlos Alberto tinha um repertório inesgotável de anedotas - e conversaram bastante. Menos o pai da Bea, o seu Vicente, que passou todo o churrasco emburrado. Sem dizer uma palavra.

Naquela noite Bea perguntou aos pais se tinham gostado do Carlos Alberto. Seu Vicente e dona Nininha se entreolharam.
- Sei não...  - disse o seu Vicente.
Bea se surpreendeu. "Sei não" por quê?
- Para começar - disse seu Vicente - , ele botou a carne em espeto baixo com o fogo mais alto. Não esperou o carvão virar brasa. Vi que ia ser um desastre quando os salsichões vieram queimados. 
- Ora, papai. O...
- Outra coisa. Ele usou salmoura na carne, em vez de sal grosso. Ninguém mais usa salmoura. A salmoura foi usada em churrasco no Brasil pela última vez na administração do Washington Luiz.
- Papai, você está dando importância demais ao...
- Tem mais! Ele botou a picanha com a gordura pra cima. O certo, o clássico, é com a gordura para baixo. E a costela ele botou com o osso para cima!
- Está bem, papai. Eu prometo que o Carlos Alberto nunca mais fará um churrasco para vocês.
- Não se trata disso, minha filha.

Não se tratava só daquilo. O importante era o que aquilo revelava sobre o caráter do assador. Alguém que se apresenta como assador sem ter a mínima ideia de como se assa não é apenas pretensioso é irresponsável. É um estelionatário. Demonstra desonestidade, arrogância e descaso pelos outros.
- O churrasco é uma ciência, minha filha. Não é para qualquer impostor.
- Mas papai...
- E o que ele inventou? Corações de galinha num espeto intercalados com pedaços de abacaxi. Não há hipótese de eu deixar minha filha casar com alguém que intercala corações de galinha com pedaços de abacaxi!
- E as sobremesas não estavam grande coisa - acrescentou dona Nininha.

O casamento foi adiado. Bea disse ao Carlos Alberto que precisava pensar.


terça-feira, 12 de julho de 2016

Mais Valter

Do conto "A princesa com alma de galinha":

Quem vai para longe vive na casa do esquecimento. Se não puderem ver ou tocar, ao menos que se saiba que estou aqui e que penso na felicidade deles como se faz num desejo de boa sorte. Talvez se salvem as pessoas todas só porque o desejamos quando o desejamos tanto. Mesmo que elas não nos entendam, mesmo que ninguém nos entenda. Talvez o desejo seja um aviso para que as coisas boas aconteçam sem precisarem de explicações complexas.