sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Cartas

Eu falei deste livro de cartas do Caio hoje, para o nosso programinha, e aí comecei a reler algumas coisas. Não posso me deixar fazer isso. Quando vou ver, estou há tempos relendo um monte de coisa. 





Trecho inicial de uma carta escrita em São Paulo, 26 de março de 1985.

Marileeeeeeeeeeeeeeeeeeeeene,

Sinto-me à beira de receber uma carta thua, mas não consigo me controlar de tanta novidade, chê. Então me ponho a escrever, 15 para as quatro de um dia paranóide (Tancredo está hospitalizado nas Glínicas daqui, dizem que levou um tiro do segurança, meeedo total - mas isso é pano de fundo social), eu aqui sozinho, após a saída de Hilda, the slave.

Bueno, vamos lá. S'as que ontem, segunda, esta Marilene aqui QUASE MORREU QUEIMADA? Estava ela no fogão, mui lépida, assando umas coxas de franga, eis que senão que sente um odor estranho vindo das bandas do dito fogão. Ela estavam mui poeticamente, de costas para o fogão, observando aquela pêxa grávida no aquário, que não se decide a parir (vão ser arianos, os demônios, eu esperava pêxes de Pêxes, s'as?). Então me viro (observe a mudança espontânea & natural da tercêra para a primêra pessoa) e eis que, atrás do fogão, vejo CHAMAS ENORMES ATÉ QUASE O TETO. Joguei água, aí chamei o Sergião que telefonava da sala (Sergião disse: "Agora tenho que desligar porque minha casa tá pegando fogo", bem natural), e ele começou a me puxar pra fora da cozinha, ao gritos de "Vai explodir! Vai explodir! Não joga água que é pior!". Marilene, ousadíssima, queria avançar entre as chamas para DESLIGAR O FORNO (ela não tinha grana para comer e sua maior preocupação era que as coxas ficassem inutilizadas, isto é, carbonizadas). Bueno, corremos para o corredor do prédio. Duas velhinhas muito velhinhas saíam do elevador. Sergião: "Corram, saiam depressa que vai explodir tudo!". Uma das velhinhas começa a desmaiar. Junta gente na porta do prédio. Seu Antônio, o zelador, vem com um extintor de incêndio. Gritos, sussurros, gemidos, faniquitos. Fumaça, cheiro de gás, "apaguem os cigarros!". Marilene correu para seu quartinho e, num sopro, apagou a vela de sete dias, juro, & LABAREDAS CADA VEZ MAIS ALTAS. Bom, o extintor apagou tudo: espuma branca por toda a cozinha e toda a sala. E fim. Marilene foi espiar se a pêxa tinha abortado: raçuda, ela - continua grávida. Ai, a tremedeira. Que medo!

Obs: Respeitando todas as gracinhas gramaticais dele. É claro. 








Um comentário:

fal disse...

hahahahaaaaaa, amo.