O inferno não são os outros, pequena Halla. Eles são o paraíso, porque um homem sozinho é apenas um animal.
A humanidade começa nos que te rodeiam, e não exatamente em ti. Ser-se pessoa implica a tua mãe, as nossas pessoas, um desconhecido ou a sua expectativa. Sem ninguém no presente nem no futuro, o indivíduo pensa tão sem razão quanto pensam os peixes. Dura pelo engenho que tiver e perece como um atributo indiferenciado do planeta. Perece como uma coisa qualquer.
Pintávamos os móveis de flores escuras. Demorávamos muito e a casa cheirava a tintas más, baratas, que demoravam a secar. O meu pai impedia-me de chorar pelo ofício da racionalidade.
Aprender a solidão não é senão capacitarmo-nos do que representamos entre todos. Talvez não representemos nada, o que me parece impossível. Qualquer rasto que deixemos no eremitério é uma conversa com os homens que, cinco minutos ou cinco mil anos depois, nos descubram a presença. Dificilmente se concebe um homem não motivado para deixar rasto e, desse modo, conversar. E se houver um eremita assim, casmurro, seguro que terá pelo chão e pelo céu uma ideia de companhia, espiritualizando cada elemento como quem procura portas para chegar à conversa com deus. Estamos sempre à conversa com deus. A solidão não existe. É uma ficção das nossas cabeças.
2 comentários:
O meu pai impedia-me de chorar pelo ofício da racionalidade.Ai, caceta.
"Eu hoje estou tão triste
Eu precisava tanto conversar com Deus
Falar dos meus problemas
Também lhe confessar tantos segredos meus
Saber da minha vida
E perguntar porque ninguém me respondeu
Se a felicidade existe realmente
Ou é um sonho meu"
... já cantava o Antonio Marcos!
Ah! os poetas... ainda bem que eles conversam tanto com a gente e nos dão a certeza de que nunca estamos sós! Viva a literatura!
Beijos, leitora querida.
Postar um comentário